Faz sentido?

Eram ao todo cinco pessoas que não se conheciam. Viviam no mesmo prédio e todas colecionavam fotos de suas famílias e outras de suas viagens, embora duas dessas pessoas tivessem hobbies complementares: uma delas colecionava fotos de cães e a outra, de famosos. Foram muitos anos que viveram no mesmo ambiente, sem se encontrar, embora tenham sido necessários somente alguns dias para que finalmente se conhecessem, numa reunião de condomínio. Mas foi aos poucos que criaram a intimidade. Vou esclarecer, para que não me interpretem mal: um deles estava se desapegando de seu passado, fugindo, embora preferisse estar onde estava, não era capaz de deixar ao Divino o cuidado de seu futuro. Do seu lado, sentaram-se outras duas. As duas se conheciam, tinham cinco amigos em comum e foram apresentadas uma à outra por intermédio destes. Conheceram o primeiro porque foram retiradas da reunião, quando começaram uma discussão bem cabida porém pouco aceita e ele, ao apoiar as outras duas, foi obrigado a se retirar também. Saíram, revoltos, mas os outros dois personagens ainda não tinham se tocado do que acontecia. Não sei exatamente o que se passava entre elas, mas a conversa paralela seguia animada. Mas, estranho destino, esse que aponto agora é chaveiro, e coleciona fotos de cães de seus clientes. Ainda não havia terminado a discussão quando os dois últimos retornaram suas consciências ao recinto e, ao se inteirar do assunto, compraram a briga e decidiram se retirar também, levando consigo todos que conseguiram afastar daquela demagogia estranha que a síndica professava. Ele, estranhamente, levou um pouco de mim. E também ela, dada a ênfase de seu discurso. Encontraram os outros três cerca de uma hora, todos ainda na porta da reunião, maldizendo os asseclas da tirania. Da maledicência, a conversação se desviou para a foto de uma toalha, que o primeiro deles obtivera durante uma viagem. As duas segundas comentaram, então, a foto de um xampu em uma posição levemente insinuante que um de seus amigos em comum efetuara acidentalmente no mercado. Os dois terceiros, rindo-se e compartilhando o motivo com o primeiro e as segundas, comentaram a captura de um condicionador em queda ao fundo de uma foto de um dos clientes daquele cuja profissão foi especificada. "Que ironia", pensava um deles, ao compreender que só o que precisam é um do outro, e poucos humanos percebem isso. A discussão em torno de um destino poderia ser facilitada imensamente, se as pessoas esquecessem as diferenças e buscassem as semelhanças.

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Faz sentido?