Financiamento recorrente e a Revolução Silenciosa

“Financiamento recorrente? De novo Fred?” Sim. Quem me conhece sabe que sou repetitivo, fazer o quê? É naquele site do Apoia.se, onde tem um monte de coisa pra você apoiar. Tem projetos educacionais, tecnológicos, ambientais, de artesanato, quadrinhos, gastronomia, fotografia e mais uma pancada de coisa. É bacana, muito bacana. Como disse na postagem anterior, eu gosto de quadrinhos, e tenho apoiado quadrinistas que já conhecia e que vim a conhecer depois de passear por esse meio.

Hoje vou falar sobre o Rafael Marçal, que já tinha mencionado antes. O cara é um bocó, na sua própria definição. Ele desenha tirinhas desde 2009 e, embora eu não o acompanhe desde seus primórdios, é um dos primeiros que conheci no mundo das webtiras. Ele “reina” na Vacilândia, um reino mágico e místico (cof mentira cof) que fica na Região Metropolitana de Hortolândia, uma megalópole no interior de São Paulo. Rei de sua própria casa, ele se define como “Rei Bocó”, e nós, reles mortais, aceitamos (indicação médica de não ser contrariado). E é muito divertido, pois ele realmente criou um reino junto com muitos outros bocós que foram se agregando em volta. Todos assumimos funções (nem sempre) úteis no reino e trabalhamos para seu desenvolvimento. Foi com ele que começamos a brincadeira de “realidade alternativa”. Quando postava o rascunho de uma tirinha (conteúdo exclusivo do clube – patente pendente), eu inventava um outro diálogo nos comentários, só pela farra mesmo. Até que um dia, a Patricia resolveu entrar na onda e, como ela manja dos fotochópe da vida, editou com o meu texto. E o resultado foi esse:





A postagem original é essa aqui (não vou colocar a imagem aqui, vá visitar o site dele!). E eu me surpreendi muito quando o próprio Rafael falou pra gente postar no grupo, e desde então virou uma brincadeira recorrente e acabou se tornando algo exclusivo pra quem participa do clube. “Mas Fred, você ta dando dinheiro pra esse cara assim, a troco de nada?” Olha, se olhar fria e calculisticamente, pode-se dizer que sim. Mas, na verdade, eu estou consumindo (sim, arte também é consumível) o trabalho dele e, como é de se esperar, pagando o que é justo! Menos do que seria justo, na verdade, pois como disse, os valores de apoio começam com dois ou três reais. Por mês. Ou seja, uma coxinha a menos por mês, e você tem acesso direto ao cara (sim, ele vira seu amigo no feice), recebe conteúdo exclusivo que ele só divulga no grupo, dá pitaco no trabalho dele (ele é bastante aberto a ouvir elogios e sugestões que estejam de acordo com seu gosto, pra todo o resto existe a guilhotina) e ainda tem chance de virar personagem de quadrinhos!!! Sério, de verdade. Vai lá dar uma olhada, pelo menos. O projeto dele ta aqui. O Rafael merece porque ele é um lindo, simpático, fofo, e tals. Pra dar um gostinho das coisas que acontecem na Vacilância, leia abaixo o relato real de um incidente ocorrido lá, pouco tempo atrás. Sangrento e violento... O texto é cheio de piadas internas que só membros do grupo entenderão (venha para o lado bocó da força!) e referências que, talvez, serão explicadas em postagens futuras. Abraço. E tals.

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Esse trecho foi extraído do livro Nem Queria Mesmo – Memórias de um Primeiro Ministro, e conta a história verdadeira daquela que ficou conhecida como a Revolução Silenciosa, uma das mais violentas de toda a história da Vacilância.


Lembro como se tivesse ocorrido poucos dias atrás. A Revolução Silenciosa. Poucas vezes temi pela minha vida, como naquela noite. Estávamos na Era Bocó, ano 8 do reinado de Rafael I (e único), o Bocó, na noite de seis de junho, uma noite chuvosa e... silenciosa.

Estava eu em meu gabinete, depois de um dia bastante atribulado e difícil. Nosso ouvidor, o Scuta Guilérme, há algum tempo vinha tendo problemas em lidar com todas as demandas do Povo, que apenas aumentavam a cada dia tanto em volume, quanto em complexidade. Por isso, ele havia partido em missão oficial para o reino de Wes, o Samp, Pinguíncipe do Norte, também conhecido como Rei dos Problemas, para solicitar apoio à nossa amada Vacilândia. Por isso, todas as demandas do povo estavam sendo encaminhadas aos meus cuidados e aquilo tomara todo meu expediente útil. Por isso, naquela noite, estava usando meu expediente inútil para continuar a tramar, digo, arcar com minhas próprias responsabilidades perante o Reino. Já passava das nove horas da noite, quando ouvi alguém bater na minha porta.

- Vá embora – eu disse. Não iria atender ao povo àquela hora da noite. Mas as batidas insistiram, mais vigorosas.

- VÁ EMBORA! NÃO TEM NINGUÉM! – Disse novamente.

Mas as batidas continuaram, como se alguém chutasse a porta. Irritado, levantei-me e abri, a tempo de ser acertado na canela pelo Paladino Gabriel, o Silva. Mais irritado, e agora com a perna dolorida, fuzilei o paladino com o olhar.

- A partir de agora, serás chamado de Gabriel, o Intrometido. O que quer? Não vê que estou trabalhando?

- Caramba, que sala gelada...

- É claro, recebi a comitiva de Will, o Leite, Pinguíncipe do Sul. Vou perguntar pela última vez, o que quer?

- Vossa Ministreza, precisamos ir. Há uma revolução em andamento.

- Revolução? Como assim? Que absurdo é esse? Não ouço nada!

- Eu sei, Vossa Ministreza, mas nosso serviço de desinteligência indica que há uma revolução em nosso reino ocorrendo neste instante. Precisamos levá-lo a um lugar seguro.

- Seu bocó! Por que está aqui? A segurança de nosso Rei em primeiro lugar (embora o Primeiro Ministro seja eu...). Por que não está escoltando o Rei Bocó?

- O Rei já foi retirado do salão do trono e está no seu esconderijo secreto, devidamente sinalizado. Foi levado pelo Paladino Gabriel, o Ramos. E o sósia já tomou o lugar do Rei no salão.

- O sósia Barroco? Aquele que nem parece o Rei?

- Esse problema foi resolvido, senhor Ministro. Colocamos uma paçoca na mão de cada um e fizemos o teste com o povo. Ninguém foi capaz de notar a diferença entre os dois.

- Brilhante! Uma ideia magnífica, Paladino! E quem foi o autor dessa solução top?

- O Povo.

- Fantástico! O Povo sempre está ao nosso lado. Do Rei, pelo menos... E quanto a mim, para onde vamos? Para o esconderijo do Rei?

- Não, senhor. Recebi ordens de levá-lo à Primeira Igreja Bocó da Vacilância. Lá, o senhor será acomodado no Bocóusoléu e ficará aos cuidados das sacerdotisas Nanda e Nina.

- Ah... – respondi – queria ir pro esconderijo também, ele nunca me leva lá... Vocês gostam mais dele do que de mim, né?

- Certamente, senhor. O povo gosta mais de Rafael I (e único), por isso ele foi eleito Rei da Vacilândia.

Fui obrigado a me conformar. Tinha que aceitar, estava sujeito a esse tipo de desgosto em nossa monarquia democrática. Era isso ou a guilhotina...

- Tudo bem, vamos à igreja. Estarei bem acompanhado. Quanto ao sósia Barroco, está seguro?

- Sim, Vossa Ministreza. Está aos cuidados do seu Guarda Bocósta e do Cavaleiro Bocó do Contraditório, o maior herói do contra de nosso reino.

- Certo. Não é grande coisa, mas deve bastar. Adiante, Paladino. Vamos.

E, assim, saímos. Tranquei o gabinete e seguimos pela porta dos fundos do palácio. O túnel que ligava o palácio à igreja ainda não estava pronto, por isso tivemos que ir pela rua mesmo, ainda que significasse colocar minha vida em risco. Mas como sempre, eu estava disposto a dar a minha vida pela Nação Vacileira e jamais seria o primeiro a sair correndo e me esconder num esconderijo secreto devidamente sinalizado. Como um outro cara que, por motivos de censura, não posso nomear.

Estranhamente, não havia movimento nenhum nas ruas. A entrada do Jardim Bocônico estava iluminada, como de hábito. Passamos pelo Monumento ao Bocó Desconhecido e cruzamos toda a Bocó Street, sem sinal de arruaça. Aquilo estava me deixando intrigado.

- Paladino, por que tudo está tão quieto? Se há uma revolução acontecendo, como pode tudo estar tão silencioso?

- Não sei, senhor. Mas nosso agente Vicente enviou relatório informando que ocorria uma revolução e que devíamos proteger nosso alto comando. E o senhor.

- Hum... Ainda estou achando isso estranho. Tem um cheiro ruim no ar.

- Estamos passando em frente à Academia Brasileira de Bocozices, senhor. Lá tem muitos bocós pensando, o cheiro ao redor não costuma ser muito bom mesmo.

- Não é isso, ó Intrometido. Sinto cheiro de marshmallow flor do arco-íris.

- Marshmallow flor do arco-íris, senhor?

- Sim, Paladino. Tem algo muito estranho no ar. Ninja Bocó, você está por aqui?

Então, ouvi uma voz misteriosa sussurrando no ar:

- Eu estou em todo lugar, Ministro. Eu tudo vejo, eu tudo sei.

- Apareça então, para que possamos conversar.

- Apenas fale e eu ouvirei.

- Posso te ver atrás do poste, seu bocó. Aproxime-se. Agora. – Respondi, com firmeza. Não podia tolerar tal insubordinação. E, como esperado, fui desobedecido. Desisti e continuei:

- O que você sabe sobre o que está acontecendo no reino?

- Sei que o Rei está nu.

- Grande novidade. Ele sempre fica quando ninguém está olhando. O que mais? Diga algo útil!

- Sei também que o rato roeu a roupa do rei da Vacilândia e por isso ele está nu, ao contrário do que as pessoas pensam. E sei mais. O salão do trono encontra-se trancado, neste momento.

- E é bom que esteja mesmo. Embora tenha sido treinado para ser sacrificado, não podemos perdeu outro sósia. Ele deve ser protegido a quase qualquer custo.

- Mas a porta não ficou trancada durante toda a noite, Ministro. Ela foi aberta, após a saída do Rei. E depois trancada de novo.

- Como assim? Quer dizer que alguém entrou lá?

A resposta foi o silêncio. Pude vê-lo correndo em sua saída evasiva nada discreta, mas achei melhor deixar pra lá.

- Paladino, quem foi que você disse ter sido o autor da ideia da paçoca?

- O Povo, senhor.

- E por que o povo não está na rua, numa noite tão chuvosa e agradável como essa?

- Não sei, senhor.

- Precisamos voltar ao palácio. Agora, Paladino. Sigam-me os bons! – E corremos. Corremos tanto quanto nossas pernas nos permitiram. Dois quarteirões depois, andamos...

Ao chegarmos ao palácio, algo de errado não estava certo, lá. O silêncio era quase absoluto. Ouvia-se apenas um zumbido contínuo e muito suspeito. Fiz um sinal ao Paladino, que sacou sua espada, e seguimos em direção ao zumbido. Paramos em frente à porta do meu Gabinete. O som vinha dali. Então, resoluto, sussurrei ao Intrometido:

- Derrube a porta.

- Mas Ministro, o senhor tem a chave...

- Derrube. É uma ordem! – E, imediatamente, o Paladino chutou a porta. Deu um grito de dor e, depois, chutou de novo, e então a porta se abriu num rompante.

Entramos. A sala estava escura, fria. Viam-se apenas duas luzes na parede do fundo.

- Eita pleura, esqueci o ar condicionado ligado. – Dirigi-me às luzes e desliguei o aparelho. Felizmente, não era eu o responsável pela conta de luz do palácio. – Em frente, Paladino. Ainda sinto aquele cheiro. Vamos em direção ao salão do trono.

Chegando às portas do salão, o silêncio reinava.

- Não tem nada aqui, Vossa Ministreza.

- Cale-se, Paladino Intrometido. E ouça, atentamente.

Nos concentramos, aproximando-nos da porta, e pudemos ouvir um zumzumzum vindo de dentro do salão. Olhamos um para o outro, intrigados. Precisávamos adentrar o salão, mas estava trancado por dentro e jamais conseguiríamos arrombar aquela porta.

- Precisamos adentrar – eu disse -, mas a porta está trancada por dentro e jamais conseguiremos arrombar essa porta.

- Vamos pela entrada secreta.

- Entrada secreta? O salão tem entrada secreta?

- Sim, senhor. Mas apenas o Rei sabe dessa entrada.

- E por que você sabe?

- Porque sou da guarda do Rei.

- E por que eu não sei?

Ele apenas me olhou, dizendo-me o óbvio com seu olhar.

- Tá, ok. Adiante, vamos à entrada secreta. Mas espera, por que essa venda?

Aquele olhar novamente.

- Tá bom, mas anda logo com isso.

E assim andamos até a entrada secreta, que até hoje não fui capaz de descobrir onde fica. A venda foi retirada quando já havíamos atravessado a porta e estávamos em um túnel, que permitia a passagem de apenas uma pessoa. Havia apenas uma direção a seguir e seguimos. Paramos atrás de uma cortina, através da qual podia-se ver a luz de dentro do salão. Fiz um sinal ao Paladino, ele de espada em punhos. Saquei minha caneta e adentramos o salão, prontos para o confronto.

Ao adentrarmos o salão, encontramos algo inesperado. O Povo, juntamente com Gabriel, o Ramos, e o sósia Barroco. Todos sentados em escrivaninhas espalhadas em frente ao trono.

- O que está acontecendo aqui?

- Estamos mantendo a publicação de tirinhas. – Respondeu o sósia.

- Como assim? Estão tomando o lugar do Rei?

- O Rei está fora há três dias – disse o Povo – e nós começamos a sentir falta das tiras diárias dele.

- Como? O Rei está fora há tanto tempo? Eu teria percebido! Tive uma reunião com ele hoje pela manhã!

- Foi comigo – disse o sósia.

- Impossível, eu teria percebido!

- Tem certeza? – Ele respondeu e pegou uma paçoca na mão. Imediatamente, ficou idêntico ao nosso monarca, indistinguível do original.

- Mas... Como?

- O Rei precisava de ajuda – disse o Povo – e eu o ajudei. Precisava se ausentar pra fazer alguns trabalhos externos e recuperar as finanças do reino. Mas o trabalho se estendeu além do planejado e, então, sentimos sua falta. Quando estive com o sósia Barroco, hoje, decidimos assumir a produção de tiras, a fim de manter a aparência de normalidade no reino. O povo já estava começando a suspeitar de algo, precisávamos tomar uma atitude.

- Mas, então, por que o agente Vicente comunicou uma revolução?

- Porque precisávamos de uma forma de deixá-lo distraído, Vossa Ministreza. Vazamos uma falsa informação de revolução, contando com nosso serviço de desinteligência. Esperávamos mantê-lo na igreja por pelo menos uma semana, até que o Rei voltasse.

- Mas... Por quê? Qual o motivo de não confiarem em mim? Por que não me contaram?

Aquela expressão outra vez. Todos me olhavam, apontando a obviedade com seus olhares.

- Tá, entendi. Eu sou golpista, blablabla, mimimi. Mas e agora? O que faremos na ausência do Rei?

- Não temam, ó povo e Povo da Vacilândia. Seu Rei está de volta! – Disse uma voz atrás de mim. Virei-me em direção à porta do salão e lá estava ele. Rafael I (e único), em carne, osso e fofura. – Amanhã retomarei a produção das tiras de nosso reino ou não me chamo Rei Bocó da Vacilândia!

E, assim, terminou a Revolução Silenciosa, quando todos se revoltaram contra minha adorável pessoa. Naquela hora, senti minha vida começar a esvair-se de mim, de desgosto, pois ninguém gostava de mim. Voltei ao meu gabinete, estendi minha cama e liguei o ar condicionado de novo, pois ao menos o frio me acolheria. E essa é a história verdadeira deste triste evento da história da Vacilândia, embora os registros oficiais o tenham relatado de forma diferente...

Um comentário:

  1. Que coisa mais linda \o/

    Vc é foda, rapaz. Baita aquisição no Clube do Bocó \o/

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